quinta-feira, 12 de março de 2009

Falsas etimologias I

Muitas vezes nos deparamos com falsas etimologias latinas, perpetradas por aqueles que têm interesses escusos em comprovar teses nada efetivas por meio da solidez do velho idioma romano. Contra tal vulgaridade, devemos esclarecer e dirimir os abusos.

A primeira das falsas etimologias, que por sorte desconheço a origem, dá conta de que aluno seria "aquele sem luz", provavelmente de a (sem) + lumnus (luz). Para começar, luz em latim é lux, lucis, ou então, lumen, luminis. Depois, alumnus, do latim, deriva-se do verbo alere, crescer, nutrir, desenvolver.

Muito usada por maus pedagogos, a falsa etimologia de aluno justificaria a idéia tola de que os professores à moda antiga enxergam seus alunos como criaturas sem luz, que só poderão brilhar através do saberes que os "mestres" vão lhes ensinar.

Moral da história: desconfie sempre de etimologias de terceiros. Qualquer bom dicionário de português traz a origem e a evolução das palavras.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Uma máxima de Horácio

Sabedor do fato de que aquilo que é dito não pode ser retirado (lembremos que há " desdito" - também uma construção verbal), o poeta latino cunhou tal idéia com uma belíssima frase:

Nescit vox missa reverti.

Vox é voz, no nominativo, o sujeito da frase.
missa é particípio passado feminino, significando emitida (atente que do particípio do verbo mittere vem missiva - carta).
nescit é o verbo desconhecer na terceira pessoa do singular.
reverti é o infinitivo presente ativo de revertor, que podemos traduzir como voltar, retornar.

Assim, uma tradução possível seria:

A voz, uma vez emitida, desconhece o caminho de volta.

Uma fábula de Fedro para traduzir (com glossário)

Lupus et agnus - Phaedrus
Facile est oprimere innocentem

Ad rivum eundem lupus et agnus venerant
Siti compulsi; superior stabat lupus
Longeque inferior agnus. Tunc fauce improba
Latro incitatus jurgii causam intulit.
— Cur — inquit — turbulentam fecisti mihi
Aquam bibenti?
Laniger contra timens:
— Qui possum, quaeso, facere, quod quereris, lupe?
A te decurrit ad meos haustus liquor.
Repulsus ille veritatis viribus:
— Ante hos sex menses male — ait — dixisti mihi.
Respondit agnus:
— Equidem natus non eram.
— Pater, hercle, tuus — ille inquit — male dixit mihi.
Atque ita correptum lacerat injusta nece.
Haec propter illos scripta est homines fabula,
Qui fictis causis innocentes opprimunt.


Glossário:

lupus, i — lobo
ait — disse
agnus, i — cordeiro
atque ita — e assim (falando)
eundem — a um mesmo
correptum — agarrado
venerant — tinham vindo
lacerat — lacera
siti compulsi — compelidos pela sede
injusta — injusta
rivus, i — córrego, regato
nex — morte violenta, assassínio
tunc — então
haec propter illos — esta é para aqueles
fauce — goela
homo — homem
improba — ímproba, insaciável
fictis causis — por causas fictícias
latro — ladrão
oprimunt — oprimem
intulit — forjou
innocens — inocente
jurgium,i — contenda
haustus — trago, gole
cur — por que
liquor — líquido, água
inquit — disse
veritatis viribus — pela força da verdade
turbulenta — turbulenta, agitada
decurrit — corre
quod quereris — do que te queixas
hercle — por Hércules
fecisti — fizeste
bibenti — de beber
laniger — lanígero
timens — temente
quaeso — por favor

terça-feira, 3 de março de 2009

Carmina 5 - Catulo - Uma tradução

Vivamus mea Lesbia, atque amemus,
rumoresque senum severiorum
omnes unius aestimemus assis!
soles occidere et redire possunt:
nobis cum semel occidit brevis lux,
nox est perpetua una dormienda.
da mi basia mille, deinde centum,
dein mille altera, dein secunda centum,
deinde usque altera mille, deinde centum.
dein, cum milia multa fecerimus,
conturbabimus illa, ne sciamus,
aut ne quis malus inuidere possit,
cum tantum sciat esse basiorum.


Vivamos, minha Lésbia, e amemos

e que o falatório dos velhos rabugentos

todos, juntos, valham-nos menos que um centavo.

Os astros podem morrer e retornar

Para nós, quando de uma única vez

a breve luz se apaga

o sono de uma infinita noite nos é imposto.

Me dá mil beijos, e depois mais cem

depois mais mil, e duzentos outros

mais mil ainda, e cem de novo.

E então, quando tivermos milhares de beijos somados

percamos a conta, esqueçamos o cálculo

para que nenhum rancoroso se tome de inveja

ao saber dos muitos beijos que foram dados.

Informações de altíssima qualidade sobre Catulo, incluindo todos os seus poemas, podem ser encontradas no site: http://rudy.negenborn.net/catullus/

A diferença básica do latim para as línguas modernas que dele se originaram

O aprendizado do latim exige do interessado, antes de mais nada, a compreensão daquiles que são os principais elementos que o diferenciam das línguas modernas que dele se originaram, como o português, por exemplo. Tal diferença é a presença de casos e declinações. Dificuldade inicial que afasta muitos alunos da língua latina, a compreensão da relação entre os casos e as declinações não é assim tão complexa e, depois de alguma dificuldade para memorizar as terminações necessárias a serem adicionadas às palavras variáveis (substantivos, adjetivos e pronomes), o latim passa a ser uma língua como as que estamos mais habituados.

Mas o que são afinal os casos e declinações?

Os casos, grosso modo, assemelham-se às funções sintáticas de uma língua como o português, por exemplo, espanhol, italiano, etc. Assim, o primeiro dos casos latinos é chamado nominativo (relativo ao nome), que exercerá função equivalente a de sujeito da frase, ou seja, sempre que uma palavra for sujeito da frase em português, estará no caso nominativo latino, ou vice-versa. O nominativo engloba ainda o predicativo do sujeito (quando há verbo de ligação).

As declinações são terminações (sempre fixas e convencionadas) agregadas às palavras variáveis para dar conta da função (caso) que exercem dentro da frase. O latim possui 5 declinações (modo como as palavras variáveis terminam). A primeira delas é a das palavras terminadas em "A", em sua maioria, como no português, do gênero feminino. Como exemplo temos rosa, regina (rainha), puella (menina), mas nauta (marinheiro).

Casos e declinações, assim, estão sempre em íntima relação, permitindo que vejamos pelas terminações das palavras, que funções estas palavras exercem dentro da frase. Em línguas como o português é preciso proceder à análise sintática para descobrir tais funções.

Visando tornar mais claro o exposto acima, basta por ora saber que um dos casos latinos, o acusativo (caso do objeto direto) é marcado na primeira declinação, quando singular, pela letra "M".

Vejamos, pois, o seguinte exemplo:

Ana mata Flávia.

Facilmente podemos deduzir quem é sujeito na frase e quem é objeto, certo? Há, porém, alguma diferença gráfica entre aquela que pratica a ação e aquela que a recebe?

Por isso, neste caso, não podemos trocar impunimente a ordem dos termos na oração acima, sob custo de invertermos por completo o que pretendíamos dizer:

Flávia mata Ana.

No latim, que explicita as funções sintáticas (casos) por meio de terminações (declinações), tal problema não ocorreria. Vejamos:

Ana necat (mata) Flaviam.

Por ser Ana sujeito, nenhuma alteração é feita, pois a letra do sujeito (nominativo) já é o "A". Flávia, porém, como objeto direto (acusativo), recebe a letra "M" depois do "A". De modo que em latim, podemos traquilamente proceder a inversão:

Flaviam necat Ana.

Continuamos dizendo a mesma coisa, pois Flávia leva consigo, graficamente, a terminação que diz qual é sua função dentro da frase.

Para finalizar este tópico, vale a pena reforçar a idéia de que no português também há casos e declinações, só que os primeiros desapareceram, e as declinações restaram apenas para marcar as diferenças de gênero e os plurais.

Carta de Paulo aos Coríntios

Momento alto da tradição ocidental, o original da Nova Vulgata é seguido pelas traduções portuguesa e inglesa (King James).

Epistula I ad Corinthios, 13 - Paulus

1. Si linguis hominum loquar et angelorum, caritatem au tem non habeam, factus sum velut aes sonans aut cymbalum tinniens.
2. Et si habuero prophetiam et noverim mysteria omnia et omnem scientiam, et si habuero omnem fidem, ita ut montes transferam, caritatem autem non habuero, nihil sum.
3. Et si distribuero in cibos omnes facultates meas et si tradidero corpus meum, ut glorier, caritatem autem non habuero, nihil mihi prodest.
4. Caritas patiens est, benigna est caritas, non aemulatur, non agit superbe, non inflatur,
5. non est ambitiosa, non quaerit, quae sua sunt, non irritatur, non cogitat malum,
6. non gaudet super iniquitatem, congaudet autem veritati;
7. omnia suffert, omnia credit, omnia sperat, omnia sustinet.
8. Caritas numquam excidit. Sive prophetiae, evacuabuntur; sive linguae, cessabunt; sive scientia, destruetur.
9. Ex parte enim cognoscimus et ex parte prophetamus;
10. cum autem venerit, quod perfectum est, evacuabitur, quod ex parte est.
11. Cum essem parvulus, loquebar ut parvulus, sapiebam ut parvulus, cogitabam ut parvulus; quando factus sum vir, evacuavi, quae erant parvuli.
12. Videmus enim nunc per speculum in aenigmate, tunc autem facie ad faciem; nunc cognosco ex parte, tunc autem cognoscam, sicut et cognitus sum.
13. Nunc autem manet fides, spes, caritas, tria haec; maior autem ex his est caritas.


1. Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine.
2. Mesmo que eu tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência; mesmo que tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, não sou nada.
3. Ainda que distribuísse todos os meus bens em sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada valeria!
4. A caridade é paciente, a caridade é bondosa. Não tem inveja. A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante.
5. Nem escandalosa. Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor.
6. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a verdade.
7. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
8. A caridade jamais acabará. As profecias desaparecerão, o dom das línguas cessará, o dom da ciência findará.
9. A nossa ciência é parcial, a nossa profecia é imperfeita.
10. Quando chegar o que é perfeito, o imperfeito desaparecerá.
11. Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança.
12. Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas então veremos face a face. Hoje conheço em parte; mas então conhecerei totalmente, como eu sou conhecido.
13. Por ora subsistem a fé, a esperança e a caridade - as três. Porém, a maior delas é a caridade.

1. Though I speak with the tongues of men and of angels, and have not charity, I am become [as] sounding brass, or a tinkling cymbal.
2. And though I have [the gift of] prophecy, and understand all mysteries, and all knowledge; and though I have all faith, so that I could remove mountains, and have not charity, I am nothing.
3. And though I bestow all my goods to feed [the poor], and though I give my body to be burned, and have not charity, it profiteth me nothing.
4. Charity suffereth long, [and] is kind; charity envieth not; charity vaunteth not itself, is not puffed up,
5. Doth not behave itself unseemly, seeketh not her own, is not easily provoked, thinketh no evil;
6. Rejoiceth not in iniquity, but rejoiceth in the truth;
7. Beareth all things, believeth all things, hopeth all things, endureth all things.
8. Charity never faileth: but whether [there be] prophecies, they shall fail; whether [there be] tongues, they shall cease; whether [there be] knowledge, it shall vanish away.
9. For we know in part, and we prophesy in part.
10. But when that which is perfect is come, then that which is in part shall be done away.
11. When I was a child, I spake as a child, I understood as a child, I thought as a child: but when I became a man, I put away childish things.
12. For now we see through a glass, darkly; but then face to face: now I know in part; but then shall I know even as also I am known.
13. And now abideth faith, hope, charity, these three; but the greatest of these [is] charity.

Saudações e termos familiares

Abaixo os navegadores do Vita Latina encontrarão algumas expressões bastante comuns para saudações e apresentações pessoais. No final do post, há um quadro com os equivalentes latinos para os membros da família.


1 — Cumprimentos

Ave — Olá. (Quando se está falando com uma pessoa)
Avete — Olá. (Quando o cumprimento é dirigido a mais pessoas)

Salve — Olá. (Quando se está falando com uma pessoa)
Salvete — Olá. (Quando o cumprimento é dirigido a mais pessoas)

Vale — Tchau, até mais, adeus. (Quando se está falando com uma pessoa)
Valete — Tchau, até mais, adeus. (Quando o cumprimento é dirigido a mais pessoas)

Quaeso — por favor.

Gratias tibi ago — obrigado. (Quando se está falando com uma pessoa)
Gratias vobis ago — obrigado. (Quando o cumprimento é dirigido a mais pessoas)

Ad crastinum diem — até amanhã.

Nos revisemus post septimanam — Nos vemos na semana que vem.

2 — Apresentações

Ego sum... Eu sou... (Os nomes em latim geralmente respeitam a semelhança com o português. Para os nomes femininos terminados em “A” nenhuma alteração é necessária. Os nomes masculinos em “O” no português passam a “US” no latim. Ex: Augusto passa a Augustus)

Mihi nomen est... Eu me chamo... (Ex: Mihi nomen est Renata)


3 — Um quadro com os membros da família

avus avô
ava avô
pater pai
mater mãe
filius filho
filia filha
frater irmão
soror irmã